A Primeira Palavra, de Hugo Santos. Um poema maravilhoso para todas as mães...
A Primeira Palavra
Hoje, pela primeira vez, disse: "Mãe".
Podia ter dito qualquer outra palavra pequenina
como "rio, flor, casa, ave, luz, cor", sei lá.
Mas não, Disse: "Mãe".
Fechei os olhos e repeti "Mãe", uma, duas, muitas vezes.
E fiquei a saber, já depois de me ouvir ante o espelho da sala,
que a palavra "Mãe", dita e ouvida assim,
como se tivesse caído do colo de uma estrela,
podia ser também "rio, céu, flor, casa, ave, luz e cor".
Dizia "Mãe" e era como se um rio corresse sob os meus pés.
Proferia-a de novo e sabia que ela era azul como o céu.
Era um nome com muitas portas e janelas,
tantas ou mais do que aquelas que tem a minha casa.
Se a dissesse mais alto, ela voava
como um dos pássaros do quintal.
Se me debruçasse sobre ela e a aconchegasse nos braços,
cheirava-me a flores.
Estava tão cheio de luzes coloridas que, mais tarde,
quando reparei nos olhos da minha Mãe, lá estavam
todas as cores do arco-íris.
Pronto, já sei. Quando voltar a dizer "Mãe",
as luzes acendem-se e a música começa a tocar.
Talvez Bach, talvez Beethoven,
talvez Chopin nas mãos mágicas
de um famoso pianista.
Vocês já pensaram no que,
quando for grande,
vou fazer com a palavra
"Mãe"?
Do livro: Eu, a Casa, os Bichos e Outras Coisas (Vega, 2008).
Hugo Santos
Hugo Santos nasceu em Campo Maior e toda a sua obra nos fala da vasta e silenciosa beleza do Alentejo raiano. Poeta, romancista e contista, tem mais de quarenta livros publicados e foi distinguido com múltiplos prémios literários dos quais são de destacar, na poesia, Corpo Atlântico, Prémio Antero de Quental, Decálogos do Bom Amor, Prémio Cesário Verde, e na prosa, os romances A Mulher de Neruda e As Mulheres que Amaram Juan Tenório que lhe valeram, respetivamente, o Grande Prémio de Albufeira e o Prémio Miguel Torga (...)
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